sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Porque eu não leio ficão científica nacional

Tentei ler alguns livros de ficção científica nacional, você pode até dizer que eu dei o azar de pegar somente os errados, mas, pelo que consultei de amigos que conhecem mais a área, a média dos livros é bem essa: histórias batidas, com uma cara americana e muito mal escritas - acrescentaria também mal editadas.

Daí eu fiquei pensando o que me incomodava nesses livros - e incomodou tanto ao ponto de abandonar a leitura no meio e ter até vergonha de dar o livro pra outras pessoas - e no que esses autores precisavam melhorar e resolvi elencar umas dicas/observações:

- antes de escrever um romance o autor precisa ler bastante. E não basta ler só o próprio gênero ou clássicos da literatura. Ler Machado de Assis, Balzac e outros é importante, sim, para vida inclusive e não só pra escritores. Contudo, esses autores são de outro tempo, sua linguagem, sua estrutura, são de outra época. É preciso ler também autores contemporâneos, ver como pessoas consagradas como bons escritores escrevem, entender sua estrutura e ver que se pode apresentar. É importante ler desde escritores mais técnicos e "cults" como Laub, Tezza e Terron como pessoas que contam bem uma história trivial como Nick HornbyDavid Nicholls;

- não basta ler também, muito menos copiar. Você tem que entender porque aquele texto funciona pra história, porque aquilo "soa bem" e a partir disso descobrir o que funciona pra você e pra história que você quer contar e criar um estilo mais ou menos próprio. É claro que você sempre será comparado com outros autores, isso é inevitável, mas se estiverem te comparando com autores bons e percebendo sutilizas que te diferenciam dessas comparações está tudo bem;

- a maioria dos livros de FC nacional que eu li - ou comecei a ler - parecem que partem de uma ideia que é muito legal na cabeça do autor e tem um desenvolvimento tradicional com no máximo um ou outro recurso - como flashback - pra criar um mistério. Isso não é péssimo, mas é monótono e previsível, o que já dificulta um pouco;

- é claro que se você escolhe escrever FC você é um fã do gênero, mas isso não precisa ser lembrado a toda hora. Referências são legais, mas ficar baseando personagens inteiros em figuras muito características - por exemplo um caçador que parece ser um Wolverine sem poderes mutantes já não é tão legal. Nomes em inglês também não funcionam muito no texto em português, a palavra parece deslocada, perdida, é claro que você poder ter personagens americanos ou mesmo contar a história toda nos EUA, mas é preciso tomar um certo cuidado, porque quanto mais você soma desses elementos que tornam a leitura estranha, melhor terá que ser sua história pra prender o leitor;

- você não tem que ser o melhor escritor da sua geração, só tem que ser bom o suficiente pra levar o leitor até o final do livro. Um escritor que consegue prender a atenção, contar uma história de forma eficiente, agradar o leitor, pode nunca ser levando em conta pela crítica, mas é lido e recomendado pelos leitores, que são quem mais importa;

- depois de escrever alguns capítulos, releia, veja se está fluindo o texto, peça pra alguém ler, leia diálogos em voz alta, pense: pessoas realmente falam assim? pessoas pensam assim?

- aos editores ou aos autores que se autoeditam: nunca diminua o trabalho dos outros escritores do gênero e digam para o leitor que aquilo é muito melhor, muito mais inovador e muito mais inteligente que tudo que existe. Uma vez li um prefácio de um autor que dizia que queria mostrar que a FC não precisava ser escrita de forma tão pobre como os autores do gênero o faziam e daí você começa a ler o livro dele e simplesmente não consegue entender de tão mal escrito que tudo foi. Outro livro propunha uma abordagem inovadora e uma história realmente pra adultos e nas primeiras páginas mostra personagens batidos e conceitos no máximo juvenis.

De tudo que eu li de FC nacional (confesso que foi bem pouca coisa, não chega a uma dezena de livros e a maioria deles foram abortados no primeiro terço da leitura) me agradaram o Sombras e Sonhos do Álvaro Domingues e o conto que saiu do Delfin no Geração SubZero - é difícil considerar essa visão como parcial pois se tratam de dois grande amigos, mas de tudo que eu li foram os únicos que são efetivamente bem escritos e que podem ser lidos facilmente inclusive por quem não é fã do gênero.

Agora, o mais importante de tudo isso que foi dito é que essas dicas são uma observação de alguém que gosta muito de ler todo tipo de coisa, então se você acha elas inúteis ou idiotas de qualquer forma, sinta-se a vontade pra ignorá-las.

Então, resumindo, eu não leio ficção científica nacional porque o tempo é muito curto pra perder com livros ruins que não me divertem - sim, se algo te diverte não importa que é ruim, ser divertido pra você é o que basta -, principalmente considerando que tem tanta coisa boa por aí pra ler.

PS.: Os livros que eu li são publicações recentes (2005 pra cá), desconheço os livros de 90 pra trás que muitos falam serem bons.

4 comentários:

  1. ABELARDO DOMENE PEDROGA29 de setembro de 2012 às 10:12

    Sem dúvida que saber a opinião de um leitor é importante, afinal sem leitor não há como, no meu caso, almejar ser escritor. Agora o que fica incógnito é: O QUE O LEITOR QUER LER? Se escreve desde a invenção da escrita e já se vão aí uns 6000/7000 anos. Fica difícil ser inovador ou escrever sobre algo que nunca foi escrito. Pior, dar "roupagem nova" a idéias já exploradas a exaustão também não é tão fácil como se imagina. Claro fica que cabe ao escritor encontrar fórmulas novas, ou mesmo reinventar algumas já antigas de forma a agradar ao leitor, o "Deus" de todo escritor. Fugir completamente dos estereótipos americanos também não é nada fácil, Afinal foram os gringos que de certa forma "inventaram" a FC. Então toda e qualquer referência que serve de base e guia para os autores nacionais acaba, de alguma forma, sendo uma releitura de algo já utilizado.
    De tudo isso fica a dúvida que poucos, ou quase ninguém, sabe responder: O QUE O LEITOR QUER LER QUANDO O GÊNERO É FICÇÃO CIENTÍFICA?
    Volto a palavra ao leitor. Eu quero saber para onde direcionar meus textos, como conseguir a atenção deste ser tão esquivo e muitas vezes silencioso chamado LEITOR.
    Um abraço e espero a répilica.

    Abelardo.

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  2. Abelardo, com certeza leitores que são fãs do gênero FC têm algumas expectativas particulares por conta da formação deles como leitores. Contudo, pra todo tipo de leitor inclusive o que gosta de ler independente do gênero, o mínimo necessário é que o texto - nem estou falado da ideia em si mas o texto mesmo - seja bem escrito, soe bem na cabeça dele quando ele lê, seja de fácil compreensão - e fácil compreensão não implica em ser pobre, mas textos complexos dependem de um cuidado muito maior que muitas vezes escritores inexperientes não possuem.

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  3. ABELARDO DOMENE PEDROGA29 de setembro de 2012 às 13:45

    Fácil compreensão, boa resposta. Aí vamos para a "velha história". Textos sem um mínimo de complexidade expõe a idéia de um autor limitado no uso das palavras. Textos com excesso de complexidade e o autor é "metido" a intelectual, e se você não entendeu alguma passagem "que leia novamente ou procure a ajuda de um dicionário". Colega não é tão fácil assim. No meu caso particular estou mais para o autor com pouca complexidade do que para o intelectual. O que acredito seja um pouco "complicado" em se tratando de FC é quando o autor usa termos "Técnicos" - positrônica, impotrônica, mísseis Schult ou quânticos e outros termos usados à exaustão. Ou quando a ação se passa quase que exclusivamente no espaço dentro de espaçonaves mais velozes que a luz, dotada de uma IA que analisa tudo a distâncias inimagináveis.
    Sei que muitos leitores não gostam que se fuja da realidade estabelecida, mas se for para escrever em cima da realidade aual estabelecida, esse tipo de texto não caracteriza FC, ao menos no meu modo de entender as coisas.
    Independente das opiniões contrárias ou favoráveis agradeço ter lido e replicado minhas considerações, é importante estar "antenado" com o que pensa e sente o leitor. Agradeço suas palavras....

    Abelardo.

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  4. Então, eu não acho que facil compreensão implica em um autor limitado.

    Por exemplo, o Laub e o seu diário da queda, ou o filho eterno do tezza, são livros absurdamente complexos no que se trata da escrita mas são leituras fluídas e de fácil comprensão.

    É claro que sempre vão existir termos e palavras que não são de uso habitual, mas elas estando no contexto da história, fazendo sentido para os personagens ou o narrador usá-las, ok.

    O problema são personagens que falam de uma forma que uma um equivalente real a ela nunca falaria, ou textos sem ritmo de leitura, ou o texto morto, aquele que não tem voz própria, aquele texto que vc não consegue ouvir uma voz dentro da sua cabeça lendo ele pra você.

    Ah, e obrigado por comentar o blog, agradeço muito opiniões variadas. aproveita e recomenda algum dos seus textos!

    Oliboni.

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